quarta-feira, 26 de novembro de 2014




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  As flores, as flores que ali vivi ! Flores que a vista traduzia para seus nomes, conhecendo-as, e cujo perfume a alma colhia, não nelas mas na melodia dos seus nomes... Flores cujos nomes eram, repetidos em sequência, orquestras de perfumes sonoros... Árvores cuja volúpia verde punha sombra e frescor no como eram chamadas... Frutos cujo nome era um cravar de dentes na alma da sua polpa... Sombras que eram relíquias de outroras felizes... Clareiras, clareiras claras, que eram sorrisos mais francos da paisagem que se bocejava em próxima...Ó horas multicolores!... Instantes-flores, minutos-árvores, ó tempo estagnado em espaço, tempo morto de espaço e coberto de flores, e do perfume de flores, e de perfume de nomes de flores !...
  Loucura de sonho naquele silêncio alheio!...

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Bernardo Soares/ Fernando Pessoa in Livro do desassossego

Imagens: Paul de Longpre