sexta-feira, 29 de maio de 2015

CHUVA NO MAR





Coisas transformam-se em mim

É como chuva no mar

....




Cantam

Carminho e Marisa Monte

domingo, 24 de maio de 2015

NOITE APRESSADA


Foto de Declan McCullagh


Era uma noite apressada
depois de um dia tão lento.
Era uma rosa encarnada
aberta nesse momento.
Era uma boca fechada
sob a mordaça de um lenço.
Era afinal quase nada,
e tudo parecia imenso!

Imensa a casa perdida
no meio do vendaval;
imensa, a linha da vida
no seu desenho mortal;
imensa, na despedida,
a certeza do final.

Era uma haste inclinada
sob o capricho do vento.
Era minh'alma, dobrada,
dentro do teu pensamento.
Era uma igreja assaltada,
mas que cheirava a incenso.
Era afinal quase nada,
e tudo parecia imenso!

Imensa, a luz proibida
no centro da catedral;
imensa, a voz diluída
além do bem e do mal;
imensa, por toda a vida,
uma descrença total!


David Mourão-Ferreira in " À guitarra e à viola"









domingo, 17 de maio de 2015

TANTO TEMPO...






Dos poentes
levarei a paz e a cor
de fogo espraiada sobre o mar

sem ondas
sem barcos
nem gaivotas.

Das tardes sonolentas e quase adormecidas
levarei a essência e os matizes das glicínias
presas às janelas de grades e às ramadas.

Do teu olhar 
levarei a suavidade do aconchego no tempo.
Tanto tempo...de viver firme, suspenso
das horas lisas das nossas manhãs

e madrugadas.


Maripa

Imagens: Pinterest






quinta-feira, 14 de maio de 2015

SERIA LOUCURA?...


deviantart.com



A madrugada levantou-se cedo.
Cada instante seguiu um a um
na manhã pintada de frescura.

Os reflexos dos raios de sol
brincaram com todas as gotas
do fino arco-íris da ternura.

E se o primordial fosse deste jeito
                                íntegro e puro?  

Se o fogo e as cinzas
as vozes dissonantes
as arritmias do tempo
as ironias do destino
as promessas viciadas
se diluíssem como sal?

E se a incoerência e a insensatez
                     sumissem no futuro?

                                Seria loucura?...


Maripa




Imagem da net

quinta-feira, 7 de maio de 2015

NÃO SEI QUANTAS ALMAS TENHO





Não sei quantas alma tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem achei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma. 
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem,
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: Fui eu?
Deus sabe, porque o escreveu.

Fernando Pessoa

Imagens: Google







sexta-feira, 1 de maio de 2015

DANÇAR À CHUVA





Ontem...num ontem muito longínquo,
em primaveras suaves aconteciam
                               dias de chuva miudinha, 
                               gotinhas transparentes
a cair do céu em fiadas brandas
quase a pedir uma licença breve
para orvalhar as árvores viçosas
                   abertas em verdes diferentes 
                   e as flores de todas as cores...

Como eu gostava de dançar à chuva,
de gozar o cheiro a terra molhada,
                   como era bom chapinhar na água
                   dos quintais da minha infância...

E o espanto perante as noites de verão
abençoadas pela lucidez das estrelas
que me sorriam ao procurar pirilampos? 


Maripa 

Imagens: Susan Batori