(...) A memória é uma paisagem contemplada de um comboio em movimento. Vemos crescer por sobre as acácias a luz da madrugada, as aves debicando a manhã, como a um fruto. Vemos, além, um rio sereno e o arvoredo que o abraça. Vemos o gado pastando lento, um casal que corre de mãos dadas, meninos dançando o futebol, a bola brilhando ao sol ( um outro sol). Vemos os lagos plácidos onde nadam os patos, os rios de águas pesadas onde os elefantes matam a sede. São coisas que ocorrem diante dos nossos olhos, sabemos que são reais, mas estão longe, não as podemos tocar. Algumas estão já tão longe, e o comboio avança tão veloz, que não temos a certeza de que realmente aconteceram. Talvez as tenhamos sonhado. Já me falta a memória, dizemos, e foi apenas o céu que escureceu. (...)
Excerto de " O vendedor de passados"
Imagem de S. Lavrentiev
José Eduardo Agualusa é natural de Huambo, onde nasceu em 1960. De ascendência portuguesa e brasileira, gosta de se definir como um afro-luso-brasileiro. A sua obra vive dessa dispersão de raízes e de uma constante viagem entre lugares e pessoas.
É autor de Nação Crioula, Um estranho em Goa e O Ano em que o Zumbi Tomou o Rio ( entre outros títulos).
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminaro que sonhamos também passa a ser realidade e memoria é também feita de sonhos.
ResponderEliminarQuerida Maripa, viajei muito de comboio ao longo da minha infância e essas paisagens exteriores que contemplamos são de facto imagens que se misturam com as que residem na nossa mente
Grata por me ter proporcionado uma recordação
beijinhos
E quando o céu escurece mas permanece luz tênue de lembranças...dói
ResponderEliminarQue maravilha esse escritor, obrigada por compartilhar.
lindo dia flor querida
beijos
Escolheste um belíssimo excerto de um grande escritor, que aprecio.
ResponderEliminarA foto é linda.
Gosto sempre de tudo nos teus posts. E da música, tão suave para este frio fim de tarde...
Beijo.
"A memória é uma paisagem contemplada de um combóio em movimento".
ResponderEliminarQue vai de Lisboa a Guarda e deixa sonhos em Coimbra.
beijos de quem tanto o esperou...
O comboio sempre me faz lembrar a viagem que fazemos na vida, entramos em uma estãção e um dia sairemos tambem
ResponderEliminarbeijinhos