terça-feira, 28 de janeiro de 2020

NUM LUGAR QUE NÃO EXISTE



Num lugar que não existe, 
tão próximo do mar quanto possível,
escrevo o último poema do ano
sem que saibas que o estou a escrever.

Sento-me rente ao derradeiro precipício
da tarde como se não tivesse vertigens.

Aliso a saia que não uso há mais de vinte
anos para que nenhum vinco gesto alusão
fique por compor.

E deixo que o vento revolva tudo o mais que
em mim existe: uma flor súbita nos cabelos,
o mais frágil e hesitante botão da blusa,
a forma como os meus dedos pronunciam
em surdina a solidão e, por fim, o que resta
de um sorriso, o que fica de sagrado do amor,
num rosto inesquecível que não é o meu.

Neste lugar que não existe,
escrevo-te o último poema do ano
e não saberás nunca que o estou a escrever.


Sandra Costa



Imagens: Google

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

DEBRUÇADA NA JANELA



...

debruçada
na janela do quarto das lembranças
absorvo o perfume a limonete,
mesmo ali, ao fundo do jardim.

É um perfume em jeito de gente
a passear ao colo da brisa
                                       passo miúdo   incerto
ternura molhada ao canto do olho
                                          a espalhar sombras
                                          e a plantar miosótis
nos canteiros do jardim dos segredos...

Permaneço no interior de mim
com a esperança de lembrar
                   das sombras     a leveza    o silêncio
                   dos miosótis     o azul que me foge.


Maripa




Imagens. pinterest


quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

SALVADOR SOBRAL - ANDA ESTRAGAR-ME OS PLANOS






Salvador Sobral partilhou no  YouTube uma versão completa da canção “Anda Estragar-me os Planos”, cuja versão original tinha Joana Barra Vaz como intérprete...




Gosto de o ouvir...

Anda estragar-me os planos

Ah faltam-me as saudades e os ciúmes
Já, tenho a minha conta de serões serenos
Quero é ir dançar

Sei por onde vou
É o melhor caminho
Não deixo nada ao acaso
Por favor, anda trocar-me o passo

Tenho uma rotina
Pra todos os dias
Há de durar muitos anos

Por favor, anda estragar-me os planos
Tira os livros da ordem certa
Deixa a janela do quarto aberta
Faz-me esquecer que amanhã vou trabalhar

Ah, faltam-me as saudades e os ciúmes
Já, tenho a minha conta de serões serenos
Quero ir dançar

Um, dois...

Ah, faltam-me as saudades e os ciúmes
Já, tenho a minha conta de serões serenos
Tardes tontas, manhãs mecânicas
Eu quero é ir dançar



(Francisca Cortesão/Afonso Cabral)





segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

HÁ SEMPRE UM EQUÍVOCO EM CADA DESPEDIDA



Há sempre um equívoco em cada despedida.


A ondulação do mar que sempre procuro na
imobilidade dos lugares, dissipada a bruma
melancólica que em mim apaga as tuas feições.

Uma estação em estado de esteio ou de janela.

A exaltação da espera no desprendimento
da última folha da magnólia, esse percurso
ininterrupto que foi a tua mão na minha.

Uma planície onde se precipita a morte.

A conjugação da luz num coração futuro,
pedaço de metal pedaço de poesia onde
escondo o ofício sincopado de permanecer tua.

«O amanhã não existe no mesmo lugar»:
há sempre um começo antigo em cada despedida.

                                                                                               
Sandra Costa



Imagens: Pinterest 

sábado, 11 de janeiro de 2020

ANTÓNIO ZAMBUJO e MIGUEL ARAÚJO





Gosto de ouvir...


                António Zambujo e Miguel Araújo



                a cantarem  "No Rancho Fundo"




o samba- canção brasileiro

 de Ary Barroso (música) 

e

Lamartine Babo (letra) 

[versão de 1931]
   

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

DA CRIAÇÃO




Da criação

invento manhãs de lugares macios
bordados a luz, águas mansas e fios de olhares
como se fossem
flores a beijar a pele
aves famintas a anunciar navios em
misturas de azul e cinza roubado ao negro
que brincam ao arco e lavam as pedras.

desdobram-se sedas
que aconchegam sons
para vestir as manhãs dos sonhos
enquanto o trinado dos pássaros semeia grinaldas de luz.


Isabel Pires



Imagens: Pinterest


sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

FIZESTE-ME





Fizeste-me cântico em versos de vidro
na imensidão  do cosmos onde fulgura
toda a exatidão do belo. Tudo parece

imutável na plenitude serena dos astros
e na ausência visível  do turbilhão
efervescente dos magmas. Mas

tudo é um poema em incandescência.
Deixa-me que me transporte para a
serenidade inalterável da luz das memórias

onde me esperará uma sinfonia de estrelas
na imaterialidade dos Tempos.


Manuela Barroso






Imagens: Pinterest