Christine Ellger
Palavras perdidas de mim
De
todos os inconfessos prodígios, um.
De todos os secretos e estranhos
vislumbres, um.
De todos os silenciosos e loucos
devaneios, um.
De
todos os sorrisos, o nem sequer imaginado.
De todas as palavras, as ainda não ditas,
as que talvez nunca venham a ser ditas.
De todos as preces, a ainda não
escutada, a que talvez nunca venha a ser escutada.
De
todos os anseios, um. O mais louco.
De todas as loucuras, uma. A mais improvável.
De todas as improbabilidades, uma. A
mais ansiosa.
De
todas as verdades, a ainda não desvendada.
De todos os caminhos, o que não poderá ser
percorrido.
De todas as companhias, a mais
intangível, a mais inconcebível.
De
todas as viagens ao fim da noite, uma, a mais atormentada.
De todos os inocentes esconderijos, um, o
mais longínquo, o mais frágil.
De todas as cicatrizes, a mais secreta,
a mais invisível, a mais oculta e negada.
Pedra
a pedra,
palavra a palavra,
loucura a loucura,
silêncio a silêncio,
espanto a espanto,
mágoa a mágoa,
contrariando o caminho, apagando
indícios, negando os passos, desenhando refúgios,
atravesso
a noite tentando desligar-me do sentido da escrita, do sentido de tudo, de
tudo.
Que
as palavras percam os seus significados, que as frases ignorem os seus
propósitos. A escrita pela escrita, a escrita no vazio, palavras caídas ao
acaso na mente em branco, palavras que não me pertencem, palavras perdidas de
mim, palavras que talvez vão pousar no coração de alguém. Talvez. Talvez.
UMJ [ blog
Um jeito manso]